O presidente do Sindicato APEOC, Anizio Melo, concedeu entrevista à equipe da Assessoria de Comunicação da entidade para esclarecer pontos importantes da batalha jurídica e política relacionada à defesa dos precatórios do Fundef para os professores e para a Educação do Ceará. Desde 2015, o Sindicato APEOC vem intensificando os esforços em torno da tese de que 60% dos precatórios recebidos pelas prefeituras devem ir para o bolso dos professores, e o restante para manutenção e investimento nas escolas. Para preservar os recursos, a entidade entrou na Justiça e solicitou o bloqueio da verba em vários municípios. Só depois dessa iniciativa é que as primeiras negociações começaram, com participação de atores sociais importantes como o Ministério Público, os sindicatos dos servidores municipais e as próprias prefeituras. Anizio Melo relatou durante a entrevista as dificuldades e conquistas em mais esse desafio. Acompanhe a entrevista:

Ascom: Anizio, por que o Sindicato APEOC resolveu entrar nessa batalha jurídica em defesa dos precatórios do Fundef para os profissionais do Magistério?

Anizio Melo: Olá professores, professoras, trabalhadores da Educação do estado do Ceará. Estamos aqui para conversar sobre o Fundef, sobre os precatórios referentes à complementação da União. Uma luta que nós do Sindicato APEOC fomos os protagonistas desde o início, ainda na implantação do Fundef, em 1996.

Nós identificamos que a complementação da União não estaria sendo feita da forma correta. Essa complementação é devida principalmente aos estados e municípios do Norte e do Nordeste que não puderam chegar ao custo anual mínimo e teriam que receber uma complementação da União. E na nossa análise, que foi confirmada posteriormente, essa complementação não foi feita. A partir daí, nós começamos a estudar formas de cobrança da União. O que nós fizemos? Primeiro aprofundamos os estudos, tentamos diálogos com prefeitos, fizemos uma série de reuniões e conseguimos irradiar, junto aos prefeitos do Ceará, essa responsabilidade de cobrança da União.

A partir dessa iniciativa do Sindicato APEOC, os prefeitos se organizaram porque cabiam a eles cobrar da União essa complementação. Por meio de ações judiciais, os prefeitos conseguiram ganhar no mérito final, ou seja, junto ao Supremo Tribunal Federal ganharam a disputa com a União. Após a conclusão dos processos, a União passou a dever os municípios os recursos complementares que não foram passados de forma correta pelo Fundef. E essa vitória dos prefeitos garantiu uma série de precatórios que começaram a ser pagos em 2015.

O problema é que a tese dos prefeitos não discutia como aplicar o dinheiro para os professores. Eles entendiam que esses recursos eram indenizatórios, portanto, poderiam utilizar da forma como bem entendessem. Nós do Sindicato formulamos uma tese que defende o investimento desse dinheiro na Educação e na valorização do Magistério, já que os recursos são originários do Fundef. Foi aí que resolvemos dar entrada nas primeiras ações na Justiça garantindo aos professores o direito de receber pelo menos 60% do precatório e evitar que os prefeitos desviassem a verba para outras iniciativas.

Em 2015, quando ninguém sabia, ninguém falava e cobrava, e muita gente negociava a aplicação dos recursos, o Sindicato APEOC teve a coragem, a ousadia, e a competência de entrar com essas ações que geravam os bloqueios. E os bloqueios geraram agora essa possibilidade concreta de que esses recursos possam chegar ao bolso do professor e da professora.

Ascom: Como você avalia a intervenção do Sindicato APEOC nesses municípios?

Anizio Melo: A intervenção do Sindicato APEOC foi feita no momento correto, da forma correta e com a abrangência necessária. Essa iniciativa gerou a possibilidade de garantirmos, na negociação ou dentro da ação judicial, o reembolso para o professor dos recursos originários dos precatórios. Ao contrário do que se fala, se não fosse a intervenção do Sindicato APEOC, nós não estaríamos discutindo a divisão desses recursos para os professores, pois as prefeituras já teriam gasto essas verbas em outras áreas, como ocorreu em alguns municípios. A ação do Sindicato APEOC vem no sentido de preservar o direito, de garantir a possibilidade, de gerar a negociação e, consequentemente, possibilitar que os recursos cheguem ao bolso dos professores. E não só para os educadores e educadoras do Ceará. Essa iniciativa ganhou amplitude e virou referência para todo o Norte e Nordeste. Cerca de 2.220 municípios, quase 1 milhão de professores, estão nessa luta árdua, que nós temos que ter unidade para enfrentá-la. Uma luta que identificou cerca de R$ 57 bilhões para cerca de 2.200 municípios e estados, ou seja, uma luta forte e pesada. Nós levantamos uma tese de que os recursos devem ir para a Educação e para os professores, e tem a outra tese dos prefeitos com outros interesses. Portanto, a intervenção foi necessária, importante, histórica, e precisa ser preservada no sentido de garantir o direito dos professores.

Ascom: O Sindicato APEOC tem legitimidade política e jurídica para atuar nesse caso?

Anizio Melo: O Sindicato APEOC tem a legitimidade, a legalidade e, principalmente, a responsabilidade de defender os interesses da Educação, da categoria dos professores, dos estudantes, de todos que fazem a comunidade escolar. Em relação a nossa atuação, nós atuamos em muitas questões gerais coletivas maiores. Fomos nós os principais protagonistas do Ceará na luta por maior e melhor financiamento, do Fundef, do Fundeb, da lei dos royalties, do PNE, do PIB, das garantias mínimas para as escolas, dos 25% mínimos obrigatórios. Então, nós temos a responsabilidade e a obrigação de defender os interesses da categoria. A questão do precatório é uma questão coletiva, a partir do momento que a gente ataca os gestores, prefeitos que não queriam, e muitos não querem ainda, repassar o dinheiro dos educadores. Nós tivemos obrigação de entrar com ações. Em 2015 só o Sindicato APEOC teve essa iniciativa. Portanto, se não fosse esse protagonismo, essa legalidade, com essa legitimidade, essa responsabilidade de agir diante do interesse coletivo, nós estaríamos hoje com essa questão perdida para outros interesses que não fosse a nossa valorização.

Ascom: Como tem sido a negociação com as prefeituras?

Anizio Melo: Em relação às prefeituras, o processo de negociação começa a mudar a partir dos bloqueios que o Sindicato APEOC conseguiu na Justiça. Os prefeitos, na sua grande maioria, tinham a previsão e o conhecimento e a vontade de pegar o dinheiro dos precatórios do Fundef e distribuir da forma como bem entendessem. Nós, a partir dos bloqueios, geramos um processo de negociação com uma fração de prefeitos que passaram a reconhecer o direito dos professores. Para isso, foi necessário homologar esses acordos na Justiça; ou a Prefeitura encaminhar para as Câmaras Municipais projetos de lei garantindo o direito dos professores, 60% para o Magistério e 40% para a Educação. Um outro grupo de prefeitos ainda está fazendo um grande movimento para ‘obstacularizar’ a luta dos professores, tanto em 1ª, 2ª e 3ª instâncias, investindo muito para que esse dinheiro não chegue ao bolso do professor e possa ser utilizado da forma como eles bem entendem. É nesse processo que nós queremos dialogar. Dialogar sem perder a essência: 60% para os professores!

Ascom: O Sindicato APEOC é parceiro dos sindicatos municipais nesses processos?

Anizio Melo: Os sindicatos municipais jogam um papel importantíssimo. Primeiro, politicamente, nós temos que demonstrar nossa unidade. O Sindicato APEOC e os sindicatos municipais de diversas matizes chegaram a um amadurecimento. Precisamos entender que essa maturidade política para enfrentar esse lobby cruel de prefeitos e governadores contra o nosso direito precisa ser muito ramificada em todo o Ceará. Por isso, o Sindicato APEOC tem feito reuniões com os sindicatos municipais para a gente ter um ponto de unidade e garantir, via ação judicial ou mesa de negociação, a forma mais rápida e perfeita para que esse dinheiro chegue ao bolso dos professores.

Ascom: E em relação ao Ministério Público?

Anizio Melo: Nós destacamos o importante papel do Ministério Público, que após a iniciativa do Sindicato APEOC, passou a atuar na fiscalização e tem entrado com ações também de bloqueio. Onde o Ministério Público conseguiu um bloqueio, nós temos feito todo esforço de fortalecer o Ministério Público, fortalecer a ação do Ministério Público e garantir que esse acordo seja efetuado via ação do Ministério Público. Onde o Ministério Público não entrou ou entrou e não teve êxito, nós temos nossas ações judiciais que beneficiam os professores e abrem o canal de negociação. Por isso, essa parceria com o Ministério Público é importante. Temos que estar do mesmo lado, professor, sindicato, Ministério Público, sociedade, para que esse recurso chegue ao seu real destinatário, que é o professor e as escolas de todo o estado do Ceará e de todo Norte e Nordeste.

Ascom: Você poderia detalhar a situação nos municípios de Fortaleza, Maracanaú e Juazeiro do Norte?

Anizio Melo: No caso de Fortaleza, o prefeito Roberto Cláudio conseguiu suspender no STF o bloqueio do Sindicato APEOC. Com esse desbloqueio, ele conseguiu pegar o dinheiro do precatório e usar em outras áreas. Nós estamos questionando essa atitude. O mérito da ação ainda não foi julgado. O Sindicato APEOC foi até a 3ª instância reivindicar o repasse dos precatórios para os professores de Fortaleza e precisamos de uma grande força para reverter e garantir essa vitória também em Fortaleza.

No caso de Maracanaú, se não fosse a ação qualificada do Sindicato APEOC, o prefeito já tinha feito um acordo com a União para que os recursos do precatório fossem contabilizados para o pagamento de uma dívida do município com a Previdência. A nossa ação conseguiu não só o bloqueio, mas também a posição do juiz de que 60% dos recursos são dos professores. Nós estamos dialogando com o Suprema, o sindicato dos servidores municipais; as bancas de advogados estão discutindo; as direções das entidades também, para que haja uma solução imediata que dê segurança aos professores, em receber os recursos; à Prefeitura, em relação ao acordo judicial, e principalmente a garantia de que os precatórios possam ficar em Maracanaú para valorizar os professores e as escolas do município.

Em Juazeiro do Norte, o embate está muito forte. Precisamos entender que o Sindicato APEOC está ao lado dos professores. O nosso real interesse é garantir que 60% dos recursos do precatório cheguem ao bolso dos professores. Por isso, a aliança com o sindicato municipal é muito importante. Nós já fomos a Juazeiro para conversar sobre isso e iremos quantas vezes for necessário. Vale destacar que não vai haver nenhum impedimento da nossa parte. O Sindicato APEOC não é empecilho para a resolução do problema em Juazeiro do Norte. Queremos garantir a segurança jurídica para que o professor receba o dinheiro que lhe é de direito. Estamos juntos nessa luta. A nossa ação conseguiu evitar que na gestão passada os recursos fossem pulverizados. Até a entrada do recurso em Juazeiro não havia bloqueio nenhum e havia uma ameaça real de que os recursos seriam utilizados em outras atividades, inclusive fora do serviço público. Por isso, o bloqueio foi importante. E a partir desse bloqueio é que o processo de negociação foi iniciado. Se o prefeito de Juazeiro tem esse compromisso, temos que garantir, por meio de uma lei municipal, homologada na Justiça, que esse recurso chegue aos professores. Então estamos todos juntos, precisamos ter essa consciência de que essa luta não é só de Juazeiro. Uma vitória em Juazeiro reflete também nos outros municípios do país que estão esperando esse êxito aqui no Estado para criar jurisprudência nacional. Nossa luta é que os recursos dos precatórios sejam 100% para a Educação, sendo 60% para os professores e 40% para manutenção e investimento no Ensino Público. É essa nossa palavra de força, coragem e tranquilidade. Enfrentamos um grande lobby e até ameaça de morte, mesmo assim estamos dispostos para dizer que a luta pelos precatórios é a luta da categoria e não vamos abrir mão. Os recursos são dos professores e da Educação!